20 agosto 2006

Duas notícias interessantes:


Publicadas na Seção de Ciência de "O Globo on line". (Eu vou deixar os links, mas o site exige inscrição – por isso vou transcrever parte dos textos)

A primeira é Identificados genes determinantes para evolução humana, e começa assim:

Reuters

LONDRES. Eles podem ser os elos perdidos da nossa evolução, áreas do DNA humano que se alteraram dramaticamente depois da separação evolutiva em relação aos chimpanzés, mas que haviam permanecido praticamente inalterados durante os milênios anteriores. Cientistas dos Estados Unidos, da Bélgica e da França identificaram 49 "regiões humanas aceleradas" (HAR, na sigla em inglês) onde há grande atividade genética.
Na mais ativa delas, chamada HAR1, eles descobriram que 18 dos 118 nucleotídeos haviam mudado desde a separação dos humanos e dos chimpanzés, há cerca de 6 milhões de anos, enquanto apenas 2 nucleotídeos haviam se alterado durante os 310 milhões de anos transcorridos desde a separação das linhas evolutivas de chimpanzés e galinhas.
"Agora temos evidências muito sugestivas de que [esses genes] podem ter se envolvido em um passo critico no desenvolvimento cerebral, mas ainda precisamos provar que realmente fez diferença" - disse o chefe da equipe, David Haussler, do Instituto Médico Howard Hughes e da Universidade da Califómia (Santa Cruz).
Os outros participantes da equipe são ligados à Universidade de Bruxelas e à Universidade CIaude Bemard, da França.
"É muito excitante usar a evolução para olhar regiões do nosso genoma que não exploramos ainda", disse Haussler. É extremamente improvàvel que a evolução de apenas uma região do genoma tenha feito a diferença entre o nosso cérebro e os cérebros de primatas não-humanos. É muito mais provável que seja uma série de muitlssimas pequenas mudanças, cada uma muito importante, mas nenhuma fazendo todo o trabalho por si só. [o artigo prossegue...]


A outra é Cientista contesta inteligênica dos golfinhos, que começa assim:

Reuters

JOANESBURGO - Tamanho não é documento. É O que sugere um artigo recém-publicado na revista "Biological Reviews of the Cambridge Philosophical Society". Segundo o neurologista sul-africano Paul Manger, apesar de terem cérebros super-desenvolvidos, os golfinhos seriam tão intelectualmente capazes quanto ratos de laboratório. Ou até menos.
- "Coloque um animal qualquer dentro de uma caixa e a primeira coisa que ele fará será tentar escalar a parede para sair dali. Esqueça de tampar o aquário e o seu peixinbo dourado certamente pulará, na tentativa de expandir o ambiente em que vive (...) Um golfinho jamais fará isso. Repare. Nos parques aquáticos, as paredes dos tanques que separam este animais dos demais são baixas o suficiente para que eles pulem. Mas eles não o fazem" - aponta o cientista.
A explicação para este comportamento, segundo Manger, é simples. A idéia sequer passa pela mente pouco desenvolvida do animal.[o artigo prossegue]

Uma observação, mais adiante, diz: "O cérebro dos golfinhos é pobre em neurônios e rico em neuróglias, que são células e fibras do sistema nervoso central que sustentam e preenchem os espaços entre os neurônios e produzem calor. Ele não é feito para processar informações complexas, mas para combater as alterações térmicas a que o organismo do animal - um mamífero - é submetido a baixas temperaturas."

Notem a diferença de tom das duas notícias. A primeira apresenta, em tom de esperança, uma descoberta que pode levar a uma melhor compreensão dos mistérios da evolução. A segunda, tem um tom sombrio de "viu só?... a gente tinha razão..."

A primeira, vale só como divulgação. Mas a segunda merece um comentário. Tinha que ser um cientista sul-africano... Eu fiz questão de transcrever a "explicação científica" (a coisa dos neurônios e neuróglias) que pode ter fundamento. Mas o raciocínio apresentado pelo eminente doutor, quanto à reação de luta-ou-fuga, é de uma cretinice apavorante. Qualquer imbecil sabe que os golfinhos são uma espécie que interage tranqüilamente com os humanos. Eles não se sentem ameaçados por nós! (Isso pode ser mesmo um indício de que não são inteligentes...) Aliás, qualquer espécie que não conheça o potencial destrutivo dos humanos interage assim (vide exemplos citados em "Montanha dos Gorilas" e "Caninos Brancos"). Será que ocorreu ao distinto cientista que os golfinhos podem ser tão inteligentes que percebem que não há futuro em "escalar as paredes da caixa"? Que eles sabem que não adianta pular para fora da piscina, sair rebolando pelos corredores e pegar um ônibus para a praia mais próxima?

Este tipo de raciocínio primário me lembra aquele – divulgado com certo estardalhaço pela "mídia" – de um médico (americano, se não me engano...) que, ao constatar que mulheres que engravidavam após os 40 anos, eram particularmente saudáveis, "deduziu" que "engravidar após os 40, fazia bem à saúde das mulheres".

Para mim isto mostra que, não importa o quão competente você possa ser em um determinado ramo do conhecimento científico, você pode continuar sendo um imbecil. Muitas vezes, chi fá, non sá, não porque lhe faltem os conhecimentos, mas porque lhe falta o discernimento.

Atualizando (Obrigado pelo link Caio de Gaia!):

O antropólogo John Hawks também comenta esta notícia sobre os golfinhos. Eu destaco a seguinte parte:

Mas, então, eu pensei com meus botões: "Ora, não é que o cérebro de Einstein tinha um número de glia incomumente alto?" Sim, é certo, mas apenas em uma única área do córtex, o que foi atribuído a uma resposta a uma desusadamente alta demanda metabólica da atividade neurônica.

Alta demanda metabólica neurônica. Hmm... Bom, pensando que seus grandes cérebros só são úteis para suas vidas aquáticas, não haveria quaisquer golfinhos com cérebros pequenos, certo? O que funciona perfeitamente, exceto para golfinhos de rios...



12 comentários:

Maria Guimarães disse...

concordo totalmente com você.
como ele define inteligência?
talvez devesse ter a ver com o contexto em que o bicho evoluiu. perceber seu meio e agir de forma criativa benéfica para si.
os golfinhos têm um sistema social complexo, capacidade de comunicação à altura, têm aprendizado e é possível que alguma transmissão cultural. experimentos sugerem que sejam das poucas espécies capazes de se reconhecer ao expelho (o bicho olha para o espelho e sabe que não é outro indivíduo). essa capacidade pode estar justamente ligada à complexidade do sistema social com que têm que lidar.
e vai dizer que o bicho é burro porque não tenta conquistar o meio terrestre? faça-me o favor...

Caio de Gaia disse...

Isto é um comunicado de imprensa, logo é preciso não ser tão agressivo com o cientista. Ele parece indicar que os golfinhos quase não têm neurónios, só glia. Mas sem ver números não me atrevo a comentar. O antropólogo John Hawks discute esse comunicado e faz uma consideração interessante: o córtex cerebral de Einstein tinha uma quantidade anormalmente elevada de glia, que se assume servia as elevadas necessidades metabólicas desses neurónios. Mas antes de criticar o autor vai ser preciso esperar pelo artigo.

Quanto às diferenças entre homens e chimpanzés, eu li esse artigo na Nature. O mais interessante é que o gene é um gene RNA, não um gene que codifica uma proteína. Ou seja, trata-se de um gene com um papel na regulação de outros genes. Trata-se de um trabalho muito importante.

Caio de Gaia disse...

Maria Guimarães, o autor não diz que o golfinho é burro por não ter conquistado o meio terrestre. A questão é por que razão um golfinho que sabe que do outro lado há golfinhos dentro de uma outra piscina a curta distância não pula para ir ter com eles. Quanto à complexidade do sistema social, eu falei há uns tempos num trabalho sobre as ovelhas. Elas conseguem reconhecer rostos, lembram-se deles durante anos, e são capazes até de identificar expressões em seres humanos.

Infelizmente não tenho acesso à Biological Reviews of the Cambridge Philosophical Society. Talvez numa próxima ida à biblioteca.

Maria Guimarães disse...

pois é, vou tentar conseguir esse artigo. aí conversamos.
sobre o outro artigo, você tem razão: é importante. cada vez mais se descobre mais evidências da importância do RNA na expressão do genoma.

Caio de Gaia disse...

Eu consegui o artigo, é gigantesco, 40 e muitas páginas. É uma leitura agradável. Pelo menos faz-nos pensar que uma mesma forma (cérebro grande) não tem necessariamente a mesma função. Não se trata de apenas falatório, está fundamentado. Ainda estou a lê-lo. Talvez venha a falar dele (dum ponto de vista descriptivo, não tenho competência para opinar com segurança).

Combina muitos aspectos desde a fisiologia e aspectos relacionados com perda de calor, até à filogenia com referências ao registo fóssil e aparecimento súbito de um cérebro grande nos golfinhos, aspectos comportamentais e cognitivos dos cetáceos, comparação com sirénios e pinípedes. O autor foca a maior parte da análise na estrutura do cérebro. Só pelas imagens do cérebro de uma orca, uma foca, e um dugongo, vale a pena. Eu tenho uma certa má vontade quanto aos animais abracáveis e confesso que ficaria deliciado com golfinhos pouco inteligentes mas é de esperar uma reacção a este artigo.

Maria Guimarães disse...

será que o artigo existe em pdf? pensei em pedir para o autor...
mas agora fico esperando o comentário completo do caio! (sem deixar que o preconceito contra os golfinhos entrem na interpretação! - eu também tenho restrições a bichos abraçáveis, mas favoreço os sociais... então os golfinhos me interessam)

João Carlos disse...

O Caio me fez a gentileza de enviar o artigo. Eu vou precisar de algum tempo para ler e avaliar o conteúdo (e consultar biólogos de verdade para os pontos que me parecerem obscuros - se bem que, em uma primeira vista superficial, não me pareça algo tão difícil assim para entender).

Veridiana Canas disse...

"...sair rebolando pelos corredores e pegar um ônibus para a praia mais próxima..."

Só se fosse uma golfinha loira!!!... ahahahhaahhahaha

"...ao constatar que mulheres que engravidavam após os 40 anos, eram particularmente saudáveis, "deduziu" que "engravidar após os 40, fazia bem à saúde das mulheres"."

ahahhahaa... Engravidar é legal pra saúde, mas péssimo pra pele!!!...rs

"...O que funciona perfeitamente, exceto para golfinhos de rios..."

Heeeeinnnn?!?!?!...rs

João, me diverti DEMAIS lendo esses textos sobre os golfinhos... tenho um aqui pra passar pro blog (fa-lo-ei em instantes) q contradiz muito do q o cientista q "tinha q ser sul-africano" disse...rs...

Amo golfinhos... se pudesse, seria um deles!!!!...

Bjo pra vc!!!

Veridiana Canas disse...

"...sair rebolando pelos corredores e pegar um ônibus para a praia mais próxima..."

Só se fosse uma golfinha loira!!!... ahahahhaahhahaha

"...ao constatar que mulheres que engravidavam após os 40 anos, eram particularmente saudáveis, "deduziu" que "engravidar após os 40, fazia bem à saúde das mulheres"."

ahahhahaa... Engravidar é legal pra saúde, mas péssimo pra pele!!!...rs

"...O que funciona perfeitamente, exceto para golfinhos de rios..."

Heeeeinnnn?!?!?!...rs

João, me diverti DEMAIS lendo esses textos sobre os golfinhos... tenho um aqui pra passar pro blog (fa-lo-ei em instantes) q contradiz muito do q o cientista q "tinha q ser sul-africano" disse...rs...

Amo golfinhos... se pudesse, seria um deles!!!!...

Bjo pra vc!!!

Jose disse...

O autor fala uma besteira sem tamanho.

Para começar os cetáceos são capazes de não só auto consciência, mas da consciência do outro.

Sua comunicação é por aprendizado, seu raciocínio lógico de causa e efeito já veio sendo bem testado. Inclusive muitas caças desses animais requerem o conhecimento de causa e efeito (como a produção de ondas criadas pelo grupo de Orcas para derrubar focas que estão em um bloco de gelo flutuante), o trabalho cooperativo é muito presente..

Há culturas em golfinhos e orcas (orcas são um grupo de golfinhos). E a sociedade é complexa, existe uma vocalização que representa cada indivíduo (como se fossem nomes). As mães ENSINAM seus filhotes a arte de caçar, eles são capazes de usar ferramentas mesmo sem ter membros...

Mesmo sem ler o artigo, dá-se pra perceber que o argumento do cientísta é totalmente sem fundamento, ele se baseia no fato dos golfinhos quando cercados não (sic) pularem pra fora do cercado (seja qual for o cercado, mesmo quando está sendo capturado os golfinhos selvagens em mar aberto).

Isso não quer dizer absolutamente nada, a não ser que a natureza social dos golfinhos os mantenham unidos.

E logicamente, tamanho do cérebro não é documento, vide os Corvos e os psitacídeos.

Jose disse...

Aah, tenho um livro formidável de um pesquidador de golfinhos no Brasil. E que ele conta histórias magníficas, como a de dois golfinhos que brincam com uma Moreia, utilizando um peixe-escorpião para cutuca-la. Ou de um dia em que ele estava pesquisando a estratégia de caça de um grupo de golfinhos (Tursiops truncatus se não me engano) em que os golfinhos largaram o que estavam fazendo pra surfar em uma onda produzida por um iate.

Abraço

O nome é O Luar do Delfim, livro do Paulo Cesar Simões-Lope

Jose disse...

E outra, os golfinhos devem ter uma aversão inata ao ambiente terrestre, um medo forte ao mundo terrestre, o mundo fora d´água deve ser um mundo inexplicável para eles.

Logo uma barreira física pode ser uma impossibilidade para ele,

É como perguntar-se por que uma pessoa sabendo que uma cobra é inofensiva não vai até certo ponto que tenha alguma coisa que ela gosta porque há aquela cobra perto ou no caminho?