08 setembro 2007

Bom... Já que ninguém topou a provocação...


"Estar consciente de sua própria ignorância é um grande passo para o conhecimento".
Bejamin Disraeli, "Sybil"


Eu adoraria iniciar este artigo com uma citação de Isaac Asimov, de um de seus artigos sobre a "relatividade do erro", mas minha biblioteca ficou em Araruama... Nele, Asimov nos lembra que somos, desde a mais tenra idade, a aceitar "absolutos": isto é "certo"; aquilo é "errado".

A título de exemplo, ele apresenta o caso hipotético de uma prova de matemática elementar, onde aparece a questão: "2+2=?". Joãozinho responde "azul" e Mariazinha responde "3,99999..." Pelas regras em vigor, ambas as respostas estão "erradas", mas a de Mariazinha está "quase certa".

Este tipo de classificação é nefasto. Incute nas crianças uma falsa certeza de que existem "verdades absolutas" e que, o que delas se afastar, por menos que seja, está "errado". O grande problema é que o Universo não é feito de "certezas". E, antes que algum matemático se levante com quatro pedras na mão, eu lembro que existem mais números irracionais do que racionais.

Se eu fosse um fabricante de rodas de carroça e quisesse calcular o tamanho da barra chata para revestir a banda de rodagem de uma roda recém-fabricada, eu poderia medir o diâmetro da roda e aplicar a fração 22/7 para cortar a barra. O trabalho de ajuste com uma lima seria bem pequeno. 3,1416 é "errado"... menos "errado" do que 3,1415925536 (usando o mnemônico: "que o cabo é ponto terrestre, eu sabia desde que nasci"), mas não existe um valor "certo" para Π...

A provocação do artigo anterior estava na passagem: Bom... Se os "Livros Sagrados" são duvidosos, só nos resta acreditar nas afirmativas dos sábios e aceitar esse novo "Deus", a "Ciência"... E ninguém mordeu o anzol...

É exatamente essa aura de "misticismo" que não podemos permitir que a ciência seja revestida.

A ciência é a eterna pergunta, onde a solução de um problema leva, não a certezas, porém a mais questionamentos. É muito fácil rotular as coisas e fingir que elas fazem sentido (aliás, é o que os místicos vêm fazendo desde sempre...), mas chamar as propriedades dos quarks de "cores" (por semelhança ao processo de adição/ subtração das três cores básicas) e pregar-lhes rótulos de "up", "down", "strange", "charm", "top" e "bottom" (as primeiras propostas para os dois últimos eram "truth" e "beauty", mas logo perceberam que "verdade" e "beleza" não se encaixavam muito bem na coisa...), não nos diz coisa alguma que possamos comparar com nossa experiência cotidiana.

Eu quase me urinei de rir na cara de um médico que se saiu com a resposta sobre o que meu filho, febril e amuado, tinha: "um rotavirus de etiologia desconhecida". E respondi: "O que quer dizer que você não faz a menor idéia do que seja!..."

Mas parece que aos nossos acadêmicos falta a seriedade de transmitir, principalmente à onipresente mídia, a não-conclusividade de suas conclusões... Que "teorias", por embasadas que sejam em experimentos, são apenas isso: "teorias".

É claro que existem "teorias" e "teorias"... Da mesma forma que a resposta do Joãozinho de que "2+2 = azul", existem "teorias" que são obviamente ridículas, em face das provas de que estão erradas. E quem prefere acreditar nessa resposta, porque a de Mariazinha não é, a rigor, correta, que se dane!... Deixem esses "casos perdidos" recorrerem a seus "Livros Sagrados", onde se "prova" que o valor de Π é exatamente 3,000 (as rodas das carroças deles vão se escangalhar rapidamente...)

Quem sabe o maior incentivo para quem está ainda aprendendo o básico, não seja exatamente a idéia de que nenhuma conclusão é, ainda, definitiva e que se pode ir ainda mais longe, extraindo da Natureza mais segredos. Que ainda não chegamos (e, provavelmente, nunca chegaremos) ao "porto seguro" do conhecimento absoluto sobre tudo, mas que sabemos onde fica o Norte e podemos traçar as rotas do progresso com uma segurança sempre maior.

E que essa "incerteza", onde os céticos enxergam apenas o acaso e os místicos, a presença divina, obedece a regras claras e nada misteriosas, e que o "sobrenatural" é apenas aquilo para o que ainda não se encontrou explicação — porque, assim que um "sobrenatural" for explicado, diversos outros "sobrenaturais" vão aparecer.

Isso, quando mais não fosse, nos pouparia de contra-argumentar (à maneira de Bizâncio) os arreganhos obscurantistas daqueles que menosprezam a "ciência", "porque ela não tem todas as respostas"... Afinal, eu sempre gosto de repetir: "Todo problema complexo tem uma resposta simples, elegante e errada".

Prefiro o bom e velho Einstein: «A hipocrisia do não-crente é, para mim, quase tão engraçada como a hipocrisia do crente.»

(Por favor, comentários aqui )